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domingo, 28 de junho de 2009

Capítulo II - No corredor


Ainda estava escuro do lado de fora. A vovó teimava em tossir, no quarto de baixo, pensei que iria morrer com falta de ar!
Olhei no relógio em cima do criado mudo, nossa, ainda não eram cinco horas da manhã. Perdi o sono, também.
Permaneci deitada na cama, com os olhos no teto, sob os lençóis amarrotados. Podia sentir os passos de meu pai sobre o carpete do corredor. Os seus passos preocupados.
Eu não gostava daqueles passos...
Faz tempo que ele está assim. Longe do seu corpo, e de mim. Tem uma semana que escuto seu andar oscilante ir e vir, sem um rumo certo. Imaginei onde suas mãos deveriam estar... deslizando sobre a palidez do rosto, pela barba mal aparada... Talvez não tremessem, apenas suassem.
Quis me levantar e ir até ele, perguntar o que havia tirado o seu sono... Mas sabia que não podia interferir. Pressentia que um ato meu ativaria sua parte descontrolada. Não poderia bater e acariciar a mesma criatura, em frações de segundos cortados. Senti ser hipócrita demais gritar e depois pedir que todos ficassem em silêncio.
Fechei meus olhos e me encolhi quando sua sombra parou diante da porta do meu quarto. Ele sempre soube a forma com que respiro quando estou lúcida.
Uma cena vagou na minha cabeça...
Meu pai entrava, sentava-se na beira da minha cama, e após um gesto de carinho, me sufocaria com as mãos.
O ar realmente fugiu de mim naquele momento. Eu abri o olhos, puxei o fôlego! Quase gritei.
Ted estava na ponta da cama. Perto dos meus pés. Olhei para ele, o sol estava mais denso, e o quarto se iluminava. Ergui-me para tocá-lo, Ted escorregou pelo lençol e caiu em baixo da cama. Respirei fundo, não tinha por que tirá-lo de lá. Mas pensei melhor, também não tinha motivos para deixá-lo jogado. Porém, era escuro...
Nao sabia o que havia debaixo da cama. Tirando meu tênis imundo e algumas roupas sujas. Eu nunca ficava para saber. Nunca precisei. Mas eu me sentia ameaçada, de algum jeito temia ser engolida pela escuridão.
Desde aquele dia...
Aquela noite escuro e agourenta.
Peguei o Ted.
Se ele não estivesse tão gelado, talvez eu não contasse isso à você.
Se os olhos dele não estivessem tao cálidos, poderia dizer que ele é basicamente um urso inútil.
Pensei em trancá-lo no sótão, mas não tive tempo. Minha avó não conseguiu respirar depois do café da manhã.
Meu pai a levou para o hospital e mandou que eu prepara-se o almoço.
Comi sozinha, na sala.
Dei uma volta no quintal, perto da castanheira. Achei um tipo de puteal lá. Tampado com um enorme bloco de concreto.
Se tivessemos vizinhos, e se os nosso vizinhos tivessem filhos, eu os chamaria para olhar. É algo realmente interessante.
Agora estou escrevendo. Abri as janelas do quarto para ouvir melhor do carro de meu pai, quando ele chegar.
Espero que ele não me ignore
Nem que me sufoque.
Eu não sabia que fazer aquilo, traria consequências tão estranhas....


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